CAPA
ALUGA TUBE É GOLPE: Investigação revela esquema de fraude com aluguer de canais do YouTube

Por Agostinho Muchave – Jornalista e Investigador em Mídias Digitais
Uma nova modalidade de fraude está a ganhar terreno nas redes sociais e a vitimar criadores de conteúdo em Moçambique e em diversos pontos do globo. Trata-se do chamado “Aluguel de Canal no YouTube”, uma prática disfarçada de oportunidade de monetização, mas que na realidade configura-se como um esquema bem articulado de sequestro digital e estelionato. A investigação, conduzida por este jornalista, expõe os contornos dessa fraude, os seus protagonistas e o impacto devastador sobre vítimas muitas vezes jovens, inexperientes e economicamente vulneráveis.
A prática, que circula sob o nome informal de “Aluga Tube”, é vendida como uma chance de transformar canais pequenos em fontes de rendimento rápido, prometendo pagamentos diários entre 100 a 150 reais brasileiros – o que em meticais representa valores entre 1.000 a 1.500 MZN. A proposta é sedutora e atinge em cheio os criadores que, desesperados por alcançar a monetização, cedem à ilusão de ganhos fáceis.
No entanto, Aluga Tube é golpe. E como todo golpe, começa com uma armadilha meticulosamente preparada.
O Esquema: da promessa ao sequestro do canal
A nossa investigação começou após o alerta feito por um produtor de conteúdos brasileiro, que decidiu expor a tentativa de fraude de que foi alvo, através de uma transmissão no YouTube. O esquema inicia-se frequentemente em plataformas como o Instagram, onde perfis como “Kelvin Zera Games” publicam anúncios dirigidos a pequenos youtubers.
O criminoso digital propõe um suposto aluguer do canal para transmissões de jogos ou futebol, sem necessidade de cedência de senhas. No entanto, após contacto directo via WhatsApp, o verdadeiro pedido surge: o proprietário do canal deve adicionar o fraudador como administrador do seu canal no YouTube – o que na prática confere pleno controlo da conta, incluindo a possibilidade de alterar senhas, excluir vídeos, ocultar conteúdos ou até apagar o canal definitivamente.
Depois de adquirir os acessos, o fraudador pode, num segundo momento, exigir valores elevados em troca da devolução do canal – uma modalidade de chantagem digital e extorsão, frequentemente aplicada contra criadores que, desesperadamente, investiram tempo e recursos no crescimento da sua plataforma.
Contexto Moçambicano: território fértil para fraudes digitais
Em Moçambique, onde o empreendedorismo digital ainda enfrenta múltiplas barreiras tecnológicas e educativas, os criadores de conteúdo emergem num ambiente desregulado e com pouca cultura de cibersegurança. A falta de políticas públicas voltadas à literacia digital transforma jovens criadores em presas fáceis para redes criminosas internacionais.
A Polícia de Investigação Criminal (PIC), por sua vez, ainda carece de divisões especializadas em cibercrimes com capacidade técnica para rastrear e neutralizar crimes que, em sua maioria, operam de forma transnacional.
Golpes semelhantes e modus operandi comum
O golpe do aluguel de canal insere-se numa gama crescente de fraudes praticadas no meio digital moçambicano e lusófono. Entre os mais comuns destacam-se:
- Phishing bancário disfarçado de oportunidades de investimento;
- Falsas vagas de emprego em ONGs e instituições internacionais;
- Perfis falsos que se fazem passar por figuras públicas para angariar donativos;
- Venda de serviços inexistentes, como desbloqueio de iPhones ou créditos móveis falsificados.
Estas práticas têm em comum o uso de plataformas digitais populares (WhatsApp, Instagram, Facebook) e um modus operandi que apela ao desespero económico do cidadão comum.
Responsabilidade das plataformas digitais
Apesar dos avisos esporádicos, as grandes plataformas digitais, como o próprio YouTube, ainda são omissas em campanhas de sensibilização específicas para países africanos lusófonos. A ausência de moderação em línguas como o português moçambicano deixa lacunas que facilitam a proliferação de golpes como o Aluga Tube.
Instamos, portanto, a Google e demais operadores digitais a assumirem uma postura mais proactiva e educativa, investindo em campanhas de alerta cibernético para regiões mais vulneráveis.
Recomendações práticas para criadores moçambicanos
- Nunca partilhar acessos nem promover terceiros como administradores do seu canal.
- Evitar propostas de monetização rápida sem verificação de origem.
- Denunciar imediatamente qualquer tentativa de fraude à Polícia ou nas plataformas.
- Investir em formação básica sobre segurança digital e ciberhigiene.
- Manter backups dos seus conteúdos e vincular o canal a um e-mail seguro e protegido por autenticação de dois factores.
Conclusão parcial da investigação
Embora a investigação siga em curso, já é possível afirmar com segurança que o Aluga Tube é uma fraude moderna com requintes de sofisticação, disfarçada de oportunidade. É urgente uma mobilização nacional entre criadores de conteúdo, sociedade civil e instituições de justiça para combater a propagação deste tipo de estelionato digital.
Mais do que proteger canais, é preciso proteger sonhos – de jovens criadores que encontram na internet uma das poucas formas de mobilidade social e expressão em Moçambique.
A presente investigação continuará a recolher dados e testemunhos e poderá ser ampliada em formato de reportagem multimédia para as plataformas de imprensa investigativa nacionais.