Educação
Bento Rupia expõe o epistemicídio afro-brasileiro à luz das conexões históricas do Sul Atlântico em Aula Pública na Unimontes
O sociólogo moçambicano Bento Rupia expôs o epistemicídio afro-brasileiro numa Aula Pública na Unimontes, abordando as conexões históricas do Sul Atlântico e propondo uma nova epistemologia africana.

UniMontes, Montes Claros – Brasil | O sociólogo e docente moçambicano, Bento Rupia, da Universidade Pedagógica de Maputo, proferiu na segunda-feira, 26 de Maio, uma Aula Pública inserida no Programa de Pós-graduação em História da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), Brasil, sob o tema “Expondo o epistemicídio afro-brasileiro à luz das conexões históricas do Sul Atlântico”.
Perante uma plateia de estudantes e investigadores, a intervenção de Rupia destacou-se pela abordagem crítica e profunda do conceito de epistemicídio, termo cunhado por Boaventura de Sousa Santos e Maria Paula Meneses, que descreve o extermínio sistemático de saberes não europeus durante os processos de colonização. O académico moçambicano levou os presentes a reflectirem sobre “um território de silêncios forçados, de vozes sufocadas, de saberes negados, uma ferida aberta na história do conhecimento humano, que sangra há séculos e cujas cicatrizes marcam profundamente nossa forma de compreender o mundo”.
Ao longo da sua explanação, Bento Rupia abordou a desqualificação do conhecimento africano, a deslegitimação do negro como portador e produtor do saber, e a consequente interiorização da inferioridade epistemológica entre os povos do Sul Global. Para o académico, o epistemicídio representa uma “forma de violência cognitiva que sequestra e mutila a capacidade de aprender melhor”, sendo o saber ocidental imposto como referência única de validade científica e racionalidade.
Rupia apresentou ainda os contornos do seu novo projecto teórico em elaboração, que denominou de Epistemologia da Esperança. A proposta visa constituir-se como um complemento crítico aos actuais paradigmas das ciências sociais, introduzindo novos conceitos e métodos a partir da realidade moçambicana e das transformações sociais que nela ocorrem. O docente aponta a necessidade de um território epistemológico referencial, enraizado na experiência africana, para contestar o que considera a falência das epistemologias tradicionais ocidentais, estruturadas a partir do racionalismo cartesiano, do empirismo baconiano e do positivismo contiano.
Segundo Rupia, o modelo ocidental de conhecimento baseia-se em dicotomias que hoje se revelam ultrapassadas e excludentes: sujeito/objecto, natureza/cultura, razão/emoção, mente/corpo, teoria/prática. Na sua óptica, estas separações conduziram à fragmentação do conhecimento, à desvalorização de formas de saber não científico e à ilusão de uma objectividade absoluta, axiologicamente neutra.
No encerramento da Aula Pública, o sociólogo revelou que o seu “Esboço de uma Nova Sociologia das Transformações e das Resistências Sociais”, actualmente em curso, pretende ser um contributo alternativo, que ofereça ferramentas analíticas adequadas para a compreensão das realidades periféricas, sem a necessidade de adaptação forçada a modelos estrangeiros.
Bento Rupia é também colaborador no Programa de Pós-graduação em Educação da Unimontes, onde lecciona e orienta dissertações e teses de mestrado e doutoramento. Esta colaboração decorre ao abrigo de um memorando de entendimento assinado em 2024 entre os reitores Jorge Ferrão, da Universidade Pedagógica de Maputo, e Wagner de Paulo Santiago, da Unimontes, que visa reforçar os laços de cooperação académica e científica entre as duas instituições.
A intervenção de Rupia foi acolhida com entusiasmo pela comunidade académica brasileira, que destacou a pertinência e actualidade do tema, num momento em que os debates sobre descolonização do saber, inclusão de epistemologias plurais e reconexão com o legado histórico afro-atlântico ganham espaço no cenário intelectual do Sul Global.
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