Ciência dos dados para melhorar os meios de subsistência dos trabalhadores informais em Moçambique

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Em Moçambique, mais de 90% de todos os trabalhadores encontram-se no sector informal, uma das mais altas taxas de informalidade no mundo. Eles debatem-se com maiores taxas de pobreza, maior insegurança económica e menos oportunidades de mobilidade a montante. Falta-lhes informação sobre tendências e oportunidades no mercado de trabalho, o que dificulta a tomada de decisões informadas. Para além destes desafios, o mercado de trabalho informal caracteriza-se por uma grande escassez de fontes de dados, o que dificulta todo e qualquer esforço de elaboração de políticas orientadas por dados. Movido por este desafio, nasceu Data for Workforce Nurturing (D4WN).

Em Moçambique, mais de 90% de todos os trabalhadores encontram-se no sector informal, uma das mais altas taxas de informalidade no mundo. Estudos recentes demonstraram que nas últimas duas décadas, apenas 18.200 novos postos de trabalho são criados no sector formal, todos os anos, ao passo que 500.000 jovens entram no mercado de trabalho no mesmo período – apenas 3,64% dos que entram no mercado de trabalho podem esperar um emprego no sector formal, sendo que 96.36% não têm alternativa, senão entrar no sector informal (Balchin, 2017). Quase 20% das pessoas que se encontram no sector informal estão no sector de serviços, representando o emprego mais comum para os jovens das zonas urbanas com baixo rendimento.

Movido por este desafio, nasceu Data for Workforce Nurturing (D4WN). Trata-se de um projecto co-criado e implementado por um consórcio multinacional liderado pela Fundación Capital, UX Information TechnologiesData Elevates. Estas organizações procuram criar um impacto social e económico positivo na vida das pessoas que vivem na pobreza, alavancando os dispositivos de informação e tecnologia de comunicação mais ubíquos e acessíveis – os telemóveis – e aplicando técnicas de ciência de dados à informação gerada por estes dispositivos. “Os mercados informais em África são um tesouro de dados para os trabalhadores escaparem à economia de sobrevivência”, diz Tiago Borges Coelho, Fundador da UX.

A D4WN é uma base de dados e um conjunto de ferramentas de dados especialmente concebidas para agregar os dados gerados pelos utilizadores do Biscate, um marketplace de trabalho a partir de tecnologia USSD/SMS sob demanda, e Com-Hector, um assistente virtual via WhatsApp para trabalhadores em Moçambique. A D4WN analisa os dados destas duas plataformas utilizando técnicas de ciência de dados, incluindo visualizações de dados, machine learning e algoritmos de recomendação, e cria inteligência de negócios para melhorar o desempenho e a prestação de serviços de ambas plataformas. Ao mesmo tempo, fornece contribuições personalizadas para ajudar a melhorar a tomada de decisões, escolhas de carreira e desenvolvimento pessoal dos utilizadores (trabalhadores informais) destes serviços – empodera-os. É desta forma que a combinação de Biscate e Com-Hector torna-se relevante através da D4WN, melhora a subsistência dos trabalhadores informais, através de maiores oportunidades de emprego e melhor informação sobre a economia informal. Através do nosso projecto, queremos também aumentar os rendimentos dos trabalhadores, expandir a nossa base de utilizadores e duplicar a participação das mulheres.

Nas palavras de Rodrigo Reyes Lanfranco, Director Nacional da Fundación Capital em Moçambique, “os dados são dinheiro. Por que não colocá-los nas mãos dos que mais precisam? Com a D4WN, damos aos trabalhadores informais acesso aos seus dados, através de mensagens cuidadosamente elaboradas”. Alexander Paxton, Chefe da Divisão de Dados na Data Elevates, acrescenta que “a D4WN combina ciência de dados e tecnologia feita para a base da pirâmide para empoderar os trabalhadores informais enquanto navegam dentro da economia informal em Moçambique e promover uma maior segurança económica”.

Na sua essência, a D4WN é uma plataforma de partilha de dados que visa permitir o teste criativo e a implementação de técnicas analíticas avançadas e de ciência de dados. Os gestores de programas, as equipas de produtos, os analistas, e os cientistas de dados estão habilitados a explorar os dados em tempo real, através de visualizações personalizadas, consultas e visualizações de dados adaptadas a cada audiência, com o objectivo final de melhor compreender os nossos utilizadores.

As constatações particularmente relevantes recebem o tratamento das equipas de conteúdo e são disponibilizadas aos utilizadores finais através de mensagens no WhatsApp. Sabemos, por exemplo, em que altura é mais provável que os trabalhadores sejam contactados pelos clientes ou quais profissões têm maior demanda do que outras, dependendo da localização. Estes dados são valiosos para os trabalhadores que podem ter mais do que uma profissão e não sabem qual delas tem maior demanda no mercado. Ao utilizar canais digitais gratuitos e inclusivos (por exemplo, USSD e WhatsApp), a D4WN assegura que os que não podem suportar os custos dos dados também possam beneficiar destes dados.

A D4WN tem o objectivo de empoderar os trabalhadores informais. Neste contexto, acreditamos que estes precisam de estar no centro do nosso processo de concepção, de modo a criar as melhores ferramentas de dados ajustadas aos mesmos. Por conseguinte, os grupos focais e as entrevistas fazem parte da nossa rotina. Estas actividades são levadas a cabo para validar as nossas ideias e também os nossos produtos minimamente viáveis (MVPs). Assim, obtivemos contribuições importantes que nos ajudaram a orientar o nosso projecto na direcção que os trabalhadores necessitam. Por exemplo, após alguns encontros de grupos focais, vimos como era importante para os trabalhadores poder registar mais do que uma profissão no Biscate. Assim, embora não estivéssemos à espera de fazer estas modificações, alteramos os nossos planos iniciais e ajustamos a plataforma à realidade. Além disso, embora acreditemos no poder dos dados para impacto, também acreditamos no poder de “consultar o nosso cliente”.

Afinal de contas, o nosso trabalho é social, humano e afectivo. Os grupos focais e as entrevistas colocam-nos em contacto com os nossos utilizadores, trabalhadores informais, de modo a fornecer-lhes as nossas ferramentas de dados e todos os outros aspectos do nosso projecto. Contudo, os grupos focais só conseguem conduzir-nos até um certo ponto em termos de aumento do empoderamento dos nossos utilizadores. Acreditamos que os nossos instrumentos de dados também devem ser supervisionados do ponto de vista ético, a fim de maximizar esse empoderamento, à medida que democratizamos o acesso aos dados que os próprios utilizadores criam. Neste sentido, estamos a criar um comité de ética que será fonte de supervisão e prestação de contas das nossas acções sob ponto de vista ético. Esta revisão ética externa do nosso projecto ajudar-nos-á a corrigir eventuais situações que possam surgir e que não estejam a ser detectadas nem pela nossa análise de dados, nem pela nossa abordagem “consulte ao nosso cliente”.

“Já passou quase um ano desde o início do nosso projecto e os dados já nos estão a dar contribuições que nunca imaginamos. A nossa visão é que até ao final do projecto, teremos aumentado o rendimento dos utilizadores da D4WN em 10% e teremos duplicado o número de mulheres que utilizam a plataforma. Para nós, este projecto funciona como uma prova de conceito, para que no futuro a iniciativa alcance mais trabalhadores informais em todo o país e, depois, noutros países da África Subsaariana, aprendendo e melhorando os nossos sistemas, assim como aumentando o nosso impacto, através de uma rede cada vez maior de parcerias que possam oferecer mais e melhores serviços de cidadania económica a este segmento”, conclui Rodrigo.

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