Um dia, brasileiros refugiados; no outro, bolivianos, venezuelanos, haitianos, angolanos, moçambicanos…
Comemora-se, hoje, a data institucionalizada para demarcar as histórias de distanciamentos compulsórios entre tantos seres humanos e suas famílias, suas histórias, suas pátrias: 20 de Junho, Dia Mundial do Refugiado.
Enquanto preparava algumas aulas sobre o tema, dia desses, distintos sentimentos e variados pensamentos me guiaram, pela literatura, ao encontro com a humanidade, especificamente, naqueles que perderam o direito à permanência em suas terras natais.
As reminiscências de minhas leituras, trafegando em textos diversos, cessaram o sobrevoo em Meninos sem pátria, de Luiz Puntel; eu lera esse romance infanto-juvenil, aos doze anos, por solicitação de um professor.
Entre memórias, surge-me Marcão (protagonista da trama), que jogava futebol de botão com seu irmãozinho Ricardo, quando seu pai adentrou a casa, avisando à esposa que o jornal no qual trabalhava havia sido “arrombado” – eram tempos de Ditadura (1964-1985) no país.
Inicia-se, assim, a narrativa de refúgio da família brasileira na França, que se prolongaria, no romance, até a publicação da Anistia em nosso país, garantindo ao Marcão (seus entes e tantos outros compatriotas) o direito de regressar ao território brasileiro.
A saga da família de Marcão se enquadra no que o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) elegeu para homenagear a partir de 2001: “mulheres, homens e crianças forçadas a deixar suas casas por causa de guerras, conflitos armados e perseguições”.
Se uma obra literária me fez viajar, na história recente, pelas questões de refugiados brasileiros, o mesmo enredo me fez pensar em outras narrativas, como as de quem, hoje em dia, vem buscando refúgio no Brasil; senão pelo final feliz, ao menos, por tramas menos dramáticas.
De acordo com o Refúgio em Números, publicado ano passado pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, em 2019, 85.552 estrangeiros se dirigiram às autoridades brasileiras como “solicitantes de reconhecimento da condição de refugiados”.
Mais do que expressivos, esses dados dizem respeito a seres humanos. Vinte (20) de Junho não pode ser apenas uma data de calendário, mas deve ser uma oportunidade para a adopção de uma postura mais uma humanizadora de todos os brasileiros; especialmente, dos poderes públicos.
O estandarte dos direitos humanos é maior que qualquer bandeira. Urge que tal lição seja ensinada em nossas escolas. A literatura, mais uma vez, promove entretenimento e, ao mesmo tempo, propicia conhecimento.
FÁBIO ROBERTO FERREIRA BARRETO. Mestre em Literatura (USP) e professor da rede pública de ensino (SME-SP).
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